Thammy Miranda é muito mais PAI do que você
Nos últimos dias tenho visto o rebuliço causado na internet pela Natura ao escolher o ator Thammy Miranda, filho trans da cantora Gretchen, como representante da campanha para o Dia dos Pais. Realmente não entendo o motivo de tanta polêmica e estardalhaço. Apesar do apoio de muitas pessoas, uma grande parte dos conversadores se apega a um mantra para lá de imbecil: “ela não pode ser pai porque não tem a ferramenta”.
Pois bem.
O que essa gente toda ignora é o
fato de que ser pai não tem nada a ver com o gênero. Tem a ver com o amor. Está
cheio de pai por aí que botou filho no mundo e não dá carinho, não dá atenção,
sequer fornece o básico para o filho sobreviver.
Então eu pergunto: isso é ser pai
para você?
Para mim, com certeza, não.
É apenas um ser que vive pelo bel
prazer de colocar filhos no mundo.
Se você é um pai desse tipo então,
sinto muito, mas sou obrigado a dizer que Tammy Miranda é mais pai do que você.
Muito mais pai que a maioria por aí.
E antes que me critiquem, digo que
posso falar isso com todas as letras, pois sei o que é abandono paternal.
Cresci sem que meu “pai” — ou, pelo
menos, aquele que forneceu sua gameta — nunca tivesse me assumido como filho.
Mesmo sabendo que era o pai.
Mesmo todo mundo ao redor sabendo.
E, mesmo sabendo, ele morreu sem
nunca ter sequer me dirigido a palavra. Nem mesmo ter me mandado uma
solicitação de amizade no Facebook.
Sem nunca ter me dado um “oi” na
rua.
Lembro que eu era criança e
costumava brincar na frente de casa e via quando a minha vó, mãe dele, vinha me
visitar em datas importantes como o Dia das Crianças ou meu aniversário. Ela,
uma senhora idosa, que caminhava com dificuldade por conta da trombose nas duas
pernas, nunca esquecia de vir à minha casa, trazer algum presente.
Talvez algum desses presentes tenha
sido comprado por ele. Talvez. Mas não sei se isso sequer importa. Ele, ao
contrário dela, nunca veio me visitar. Exceto uma vez, quando eu era criança e
tinha uns 4 ou 5 anos e me escondi embaixo da cama porque não sabia quem era
aquele estranho no portão.
Eu, com quase 50 anos nas costas,
ainda sofro com isso. Com a ausência, o desprezo. O abandono puro e simples.
Por isso não entendo porque as
pessoas insistem em condenar e criticar uma pessoa que é pai por escolha, não por
genética. Não compreendo como podem não aceitar que uma pessoa faça o papel de
pai enquanto.
No fundo, as pessoas esquecem que
tudo isso tem a ver com o amor. Um homem que abandona o filho à própria sorte
não é pai, isto é, não pode ser chamado de pai mesmo que seja o legítimo
progenitor.
Simples assim.
Em compensação uma mãe que cria os
filhos sozinha, dando amor e carinho, pode ser chamada de pai com todas as
letras.
Um tio que vende a própria camisa do
corpo para comprar leite (como foi o causo do meu) também pode ser chamado de
pai.
Um padrasto, irmão, tia, primo, avó,
até o bispo. Todos esses podem ser chamados de pai e protagonizar uma campanha
de Dia dos Pais.
Pai não é só quem cria, mas quem
zela, dá amor, conforta, repreende.
Pai é quem está presente no primeiro
dia de aula, na formatura, quem leva ao médico, quem aconselha, briga, elogia,
critica.
Um pai de verdade não abandona.
Assume.
Um pai de verdade não tem gênero
específico.
Rico, pobre, cego, manco, homem,
mulher. Tanto faz. O que realmente importa é o amor.
Gente, o amor.
Logo, dizer que um homem trans não
pode ser pai é de uma burrice e insensibilidade enorme.
Então, parabéns à Natura pela
coragem de botar o dedo na ferida e, mais uma vez, ajudar a colocar abaixo os
preconceitos e mostrar ao mundo o verdadeiro valor da palavra PAI.
Maximiliano da Rosa
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